terça-feira, agosto 21, 2012

Notas ao Foro Académico




Muito se ouve falar em “Foro Académico”, mas muitas vezes não se percebe muito bem o que tal é, nem o que implicava.
Já disso aqui se falou a propósito do Traje Académico que, como aqui explicado, foi “criado” para distinguir, precisamente, o “foro académico”, ou seja, aqui, com o sentido de classe laboral/social diferenciada de outras profissões e mesteres.


Mas o “Foro Académico” era bem mais do que isso.

De facto, os sucessivos regimentos, criados por determinação régia, tinham por finalidade, entre outras, dotar a Universidade (Estudos Gerais) de uma “lei orgânica” própria que facilitasse aos seus dirigentes a coordenar e supervisionar o funcionamento institucional em todas as suas facetas e aspectos.
Para tal, foram ao longo dos anos, atribuídas diversas regalias e benefícios que visavam defender e promover os Estudos Gerais. Nas palavras de Joaquim de Carvalho,


“Dentre estes privilégios um se destaca: o foro académico, cível e criminal. O que até então havia sido costume tacitamente aceite e porventura impreciso, tornou-se lei categórica pela carta régia de 4 de Maio de 1408, na qual D. João I, fixando o poder jurisdicional do conservador da Universidade, ordenava «a todallas Justiças, quaeesquer q sejam destes Regnos, que daqui emdiante nom conheçades de feito nenhilu crime nem çiuell de nenliú scollar q seja do corpo da dita universidade, mais que como forê achados em alg-üu malleficio, ou delles for dada querela ou denunciaçom, e forem presos per noso mandado em nossas prissões, ou vos forem demandados per o dito conservador, que logo os entreguedes ou mãdedes entregar ao dito sseu conservador, q hora he, ou pellos tempos adiante forem, que ouçã e desembargê, assi os ditos ffectos crimes como çivees, de quaees quer scollares, e os livre como achar q he dereito, dando nos fectos crimes appellaçam pera nos, e nos fectos çivees agravo; e se por vemtura algútis scollares teemdes presos, mandamos vos q emtreguedes ou mandedes emtregar logo pera o dicto conservador veer sseus ffectos, e os livrar com sseu dereyto, como dito he [...]» (apud Dr. António de Vasconcelos, Origem e evolução do foro académico privativo da antiga Universidade portuguesa).
Como no passado, os privilégios e foros universitários, essenciais para a vida e progresso da Universidade, encontravam a resistência das justiças reais, quando não do próprio conservador da Universidade. Os escolares, sobretudo, foram os mais queixosos, ora contra os almotacés, ora contra os conservadores, ora contra as limitações das suas regalias tradicionais, ora contra o pagamento das coletas aos lentes e ao bedel.”
[1]


Claro está que o facto de, a coberto de certas regalias e isenções, e nomeadamente pelo facto da justiça académica ser mais branda que a civil, excepção feita aos denominados “crimes de sangue”, cujo exemplo mais conhecido é o da personagem Simão Botelho, no clássico “Amor de Perdição” de Camilo Castelo Branco ou em casos excepcionais que obrigavam a derogar o privilégio do foro privativo, como este, ocorrido em idos de 1721:


"(…)sendo-me presente que na ocasião dos touros que houve no mosteiro de Santa Clara, extra-muros da cidade de Coimbra, se mascararam alguns estudantes, que juntos foram em um dia insultar o juiz de fora e em outro o corregedor da comarca, que vendo o excesso dos ditos mascarados e intentando prendê-los, estes lhe resistiram com armas de fogo, e lhe feriram um alcaide, e que, não obstante a resistência, o dito corregedor prendera nove dos mascarados; fui servido resolver que o corregedor tirasse logo uma exacta devassa e que, sem embargo dos mascarados serem estudantes, não remetesse os presos nem as culpas ao conservador seu privativo, derogando por esta vez os privilégios dos ditos estudantes, como protector que sou da mesma Universidade (…)” [2].


Resumindo, e parafraseando Paulo Drumond Braga [3]"(...) salvo em raríssimas excepções, os professores, estudantes e funcionários eram julgados pela própria academia, ficando isentos das demais justiças existentes no reino. Nesse ponto, a universidade era comparável à Igreja.".


Assim,

"A Universidade gozava de grandes privilégios, que lhe foram dados por D. Diniz e confirmados pelos reis seus sucessores. Um deles era a isenção do foro comum, concedida a professores, estudantes e todas as pessoas da Universidade. A princípio estiveram sujeitos ao foro eclesiástico; mais tarde, a um foro privativo (foro académico )exercido por juízes ou conservadores próprios, tanto para as causas crimes, como para as cíveis. Este foro especial só acabou com a implantação do regime liberal.” [4]

Ora, um dos aspectos que mais revoltava a população era o facto de os estudantes, muitas vezes a coberto das suas capas (embuçados), cometerem diversos crimes, desde o roubo a diversos ajustes de conta por honra.
Eram comuns os espancamentos e a zaragatas que passavam impunes, pois que as populações nada podiam fazer.A violêncisa era, aliás, uma das características mais identitárias das relações inter e extra estudantis:

"A sociedade da época apresentava um elevado teor de violência e a vida estudantil não era excepção. Não admira, pois, que surjam na amostragem em estudo numerosas agressões físicas.
Os estudantes feriam mulheres, mas sobretudo homens, maioritariamente outros estudantes, fosse
por que motivo fosse, até mesmo por acidente, recorrendo a diversos tipos de armas, desde simples paus e pedras a facas e punhais. Faziam-no de dia e de noite, sozinhos ou em bandos, deixando ou não sequelas físicas na vítima. Para além dos colegas, os estudantes agrediam outro tipo de pessoas, até mesmo mulheres. Agiam sozinhos ou em grupo. Faziam as clássicas emboscadas: "o forão esperar na Rua dos sapateiros da dita cydade e com armas ofensiuas e defensiuas como erão punhaes facas e paus lhe derão hua ferida na cabeça e outras pancadas pelo corpo".
Assim aconteceu com um estudante, vítima de um grupo de que fazia parte Jorge Pinto, perdoado em 1621. Feriam de dia e de noite. O leque de motivos para as agressões era vasto, desde o alegadamente acidental até à troca de palavras."
[5]


Proibidos que estavam os estudantes do uso e porte de armas, mesmo as “armas brancas” – especialmente mencionadas nas disposições régias de D. João III (1538), onde se determinava [6], que os estudantes “não tragam punhal nem adaga” e nos Estatutos de D. Manuel, de 1591 [7],


“Nenhum estudante trará armas ofensivas e defensivas, de qualquer sorte que sejam, ainda que seja faca ou canivete, de dia nem de noite, nas escolas, nem fora delas, pela cidade e seus arrabaldes, e quem o contrário fizer, pela primeira vez perderá as armas para o meirinho ou guarda das escolas, qual primeiro o acusar, e pela segunda vez, alem de as perder, estará preso oito dias”.

 Muitos eram os que para gozar do foro académico se inscreviam como estudantes (durante muitos anos a frequência foi livre e, até muito tarde, não havia sequer exames). Segundo Soror Águeda María Rodríguez Cruz,


“Houve épocas, sobretudo nos primeiros séculos, em que se matriculavam também pessoas alheias ao estudo, com vista apenas a gozarem do foro académico, como os boticários, arrieiros, artesãos, donos de pousadas e provedores de estudantes, etc., até a Coroa acabar com este abuso” [8]

Muitos estudantes só o eram mesmo de nome, pois que se dedicavam, especialmente, a actividades criminosas ou ilícitas, à sombra da protecção do seu estatuto estudantil. Diz-nos Teixeira Bastos [9], acerca desses bandos:

“A que maior celebridade adquiriu foi o Rancho da Carqueja que cometeu as maiores tropelias em 1720 e 1721, sendo reitor o Dr. Sanches de Baena.
Um dos seus fins era raptar donzelas, levando a audácia a ponto de pretenderem raptar uma sobrinha do próprio reitor.
Uma das suas proezas foi fazer despir um novato e açoitá-lo com disciplinas, depois de palmatoadas e corte rente do cabelo.
Foi preciso vir a Coimbra força armada para o conter.
Chegada a força (regimento de Fevereiro de 1721), foram presos trinta e tantos estudantes e conduzidos algemados para Lis- boa. D. João V mandou-os degredados para a índia, e o seu chefe, o estudante canonista, Francisco Jorge Aires, da Vila da Feira, acusado dum assassinato, foi degolado
[no pelourinho, a 20 de Junho de 1722], sendo a sua cabeça remetida para Coimbra, e aqui exposta na Praça de S. Bartolomeu (desde 1 de Julho de 1722).
Apesar deste rigor, aparece outro rancho
[Chamado Rancho dos Doijfe], poucos anos depois, em 1737, composto de doze estudantes, que armados percorriam as ruas de noite, fazendo esperas a outros estudantes e cometendo as maiores tropelias.
Em 1803 existiu em Coimbra um Novo Rancho de cinquenta a sessenta estudantes libertinos: tinham uma casa, onde à noite se juntavam a comer e beber, a dançar com meretrizes, e donde saíam armados a infestar a cidade.
Foram presos os principais (uns dezoito), e o rancho desfez-se.”



Era, muitas vezes, armados de navalhas e pequenas facas, mas também do varapau (arma de eleição) e, por vezes, moca que se cometiam as piores atrocidades, especialmente contra caloiros [10], conhecidas por "Investidas" e, mais tarde, por "Troças" ou "Assuadas", muitas vezes encapuzados ou com máscaras, mas também contra os próprios professores (em artigo anterior demos conta de um desses casos, embora mais recente e, pelos vistos, menos grave).




A abolição do Foro Académico e 
criação da Polícia Académica
 



O juízo privativo da UC é extinto por força do art.º 145º, alínea16, da Carta Constitucional de 1826, sendo tal abolição reforçada pelo art.º 38º do decreto de 16 de Maio de 1832 e pela portaria de 23 de Maio de 1834 (ano em que, em Espanha, também o foro é abolido e o traje estudantil proíbido).
Só as forças armadas continuaram a possuir juízo privativo, castigos físicos, código de justiça e corpo  de magistrados próprio.
Com a extinção do Foro Académico (também designado pro Juízo da Conservatória da UC), os delitos extra-disciplinares passam a correr nos tribunais civis (Juízo Criminal da Comarca de Coimbra).
Mas porque se verificou a necessidade, urgente, de dotar a UC de meios e poderes mais amplos, e autónomos,de acção disciplinar, foi publicado no Diário do Governo de 25 de Novembro de 1839, o "Regulamento da Polícia Académico", chancelado pelas assinaturas de D. Maria II e Júlio Gomes da Silva Sanches.
Nascia, assim, a Polícia Académica.
 
Conhecido por "Decreto Sanches", tratava-se, afinal, do verdadeiro Regulamento Disciplinar da UC.
Foi a este regulamento que se continuou a chamar de "Foro Académico", um erro que duraria por mais 71 anos.
Este regulamento possuía poderes mais amplos que os comuns regulamentos disciplinares em vigor nos liceus, seminários ou colégios particulares, servindo de instrumento de enquadramento disciplinar e social.
Este regulamento dotava a UC, das seguintes prerrogativas (que a Polícia Académica se encarregava de executar):
 
  • Vigilância e manutenção da ordem em todos os espaços do Paço das Escolas Gerais e suas dependências;
  • Inspecção dos uniformes docentes e discentes e dos oficiais administrativos;
  • Policiamento nocturno das ruas, casas d ejogo clandestino, prostíbulos e tascas;
  • Instauração de processos disciplinares por desrespeito, agressão, roubo e homicídio;
  • Aplicação de penas através de acórdãos ratificados pelo Conselho de Decanos.
 As penas que os estudantes mais detestavam (odiavam, mesmo) era a o encarrecramento na prisão académica ou a expulsão, temporária ou definitiva, da UC.
 
E muito trabalho tinha a polícia académica, numa sociedade cultural  socialmente violenta.

Com efeito, e a título de exemplo, um dos grupos organizados mais violento era proveniente da Republica do Carmo, composta de estudantes que residiam na Sofia, no antigo colégio do Carmo, e deles se dizia que

 “Até de dia andavam armados de punhais, e cometera'm vários crimes. No começo do ano lectivo de 1838- 1839 foi assassinado o Dr. Serafim, professor do Colégio das Artes; em 20 e 21 de Maio daquele ano houve facadas, tiros, arrombamentos, completa anarquia em toda a cidade. Um lente de Medicina, o Dr. Cesário Pereira, foi gravemente ferido com dois tiros, na noite de 3o de Junho de 1839; dois lentes de Filosofia, os drs. Pinto de Almeida e Pereira de Sena, foram insultados e ameaçados.
Em 1841, na noite de 26 de Dezembro, foi morto pela força pública, agredida, um dos da quadrilha.
Esta desfez-se pouco depois, em Janeiro do ano seguinte.”
[11]




Não é alheia a toda esta febril violência a influência dos conflitos entre liberais e absolutistas dentro de uma academia fortemente politizada, mas desengane-se que pense que Portugal era brando de costumes, como disso se faz propaganda. Muito pelo contrário. No caso do universo estudantil coimbrão, temos verdadeiros grupos de bandoleiros e uma cultura de opressão e humilhação que eram, na verdade, actos criminosos puros e duros.
A casa reitoral considerava os ritos iniciático-punitivos de caloiros como sendo condutas que transgrediam dolosamente o regulamento disciplinar, agindo contra os alunso prevaricadores com maior ou menor severidade, conforme os meios de que também dispunham, e que não eram muitos.
Com efeito, os levantamentos estudantis provam a incpacidade da Polícia Académica perante situações de maior proporção. Lembramos, por exemplo o levantamento estudantil de maio-junho de 1846 , com os estudantes a formarem um batalhão (Maria da Fonte) e a deambularem entre Coimbra e Lisboa (e novamente para Coimbra) espalhando o pânico entre a população; ou ainda aquele que teve lugar entre Outubro de 1846 e Junho de 1847, com os estudantes em surtidas violentas entre Coimbra, Porto e Setúbal (Patuleia), ou ainda a de 1853, a que só como recurso ao exército se conseguiu por fim a tal sublevação.
Já aqui relatámos o caso de um caloiro que foi batido até à morte porque se virou contra os veteranos que o queriam rapar.

Outras vezes, eram os veteranos a terem menos sorte, como relata o periódico o Conimbricense, de 1877, falando de um episódio violento ocorrido anos antes:

“(…) no dia 3 de Maio de 1873, pelas 8 da noite, junto do Castelo, foi cortado o cabelo, à força, a um estudante. Este, logo que se viu livre dos agressores, atirou contra o grupo uma pedra, que feriu mortalmente um deles.” [12]





Sabemos que, conforme os "ventos reitorais" (o feitio do reitor) ou os caprichos da instabilidade da conjuntura política, archeiros e guarda-mor eram mais ou menso tolerantes e permissivos. Se, como diz António Nunes (2013, p.74-76), cujo trabalho nos serve de guia neste capítulo, havia advertências mais irritantes (como a proibição do uso de bigode, ou de fumar no recinto universitário - quanto à proibição de fumar, muito contestada e tida como autoritária e reaccionária, ela resulta do pãnico em que vivia a reitoria por não possuir corpo de Bombeiros que pudesse acudir a um incêncio que resultaria, na certa, dadas as condições dos edifícios,  na perda irreparável do património arquitectónico e do acervo da UC) resultantes de preconceitos morais ou da moda em voga, já outras advertências e penalizações eram propensas a que os estudantes sentissem, por vezes, um certo desafogo, multiplicando-se, depois, as caçoadas e demais partidas.
 
Em 1843, procurando normalizar a situação de profunda instabilidade que reinava na UC, é dada ao reitor da UC, através da Portaria de 27 de Setembro, o poder de reprimir os abusos observados, nomeadamente em grupos mais ou menos identificados, que afrontavam a autoridade usando bigodes, lobas curtas, que ostensivamente fumavam nos edifícios históricos, e que criavam desacatos na Via Latina e nos Gerais.
Naturalmente que todas as acções disciplinares incendiavam os ânimos e cavavam um cad avez maior distanciamento entre a UC e os próprios estudantes (cujo traje usado na época acabaria por ser um dos "bodes expiatórios" e levaria a uma mudança no figurino vestimentário -aliás é em 1843 que pela última vez o termo "loba" aparece na documentação académica como vocábulo corrente).

Os sucessivos abusos, quase sempre na esfera do crime, o crescente descontentamento das pessoas e os ventos do liberalismo, começaram a fervilhar no caldo do anti -lericalismo (onde os “velhos costumes”, a começar pelo traje talar, eram tidos como sinais de uma Igreja decadente e de uma ordem instituída que já não funcionava).


Novas mentalidades exigiam que Portugal acompanhasse a modernidade, olhando, por isso, de soslaio, para as velhas lobas, os enraizados privilégios, as isenções em favor do foro como sendo impeditivas do progresso e de uma sociedade mais justa.


Natural, pois, que se começasse a assistir, a partir da década de 1880 (a 1ª proposta de lei é de 1883), a movimentações contra a manutenção do designado " foro estudantil" e se levantassem as primeiras vozes reacionárias, utilizando, precisamente, a imprensa para dar eco a tais pretensões.
 


Aqui ficam alguns artigos bastante elucidativos (clique nas imagens, para ver com mais definição).

 






 O Commercio de Vizeu, 05 Fevereiro 1888, III Anno, Nº 166



O Commercio de Vizeu, 01 Março 1888, III Anno, Nº 17



O Comércio do Porto, 26 Março 1888 p. 1



Claro está que, como acima referimos, o Foro Académico há muito fora, de facto abolido, contudo mantinha-se a disciplina (Regulamento da Polícia Académica) com um aperto nem sempre severo, conforme a magnanimidade das autoridades académicas, por norma mais propensas na defesa "dos seus".
Fartos de sentirem na pele a injustiça que era a futura elite social comportar-se como bárbaros e ainda por cima gozarem de uma inadequada condescendência (na óptica da sociedade, já se tinha chegado ao ponto de ruptura), as vozes fizeram-se  ouvir cada vez mais fortes contra o regime permissivo que gozavam os estudantes da UC.
Um eco que teve foret acolhimento junto dos republicanos que, chegados ao poder, trataram de imediato de reformar o ensino universitário e acabar de vez com o status quo ainda reinante na comunidade discente.



A Extinção da Polícia Académica



Com um discurso propangandístico que pudesse ser melhor absorvido, António José de Almeida, então Ministro do Interior do Governo Provisório da República, anuncia, perante o novo reitor da UC, Manuel de Arriaga -(colocado pelo governo, como forma de "renovar a Universidade)  o fim do odiado "foro medieval", na verdade não está, de todo a extinguir esse foro, porque o mesmo já não existia.
O que na prática sucedia era a extinção do Regulamento da Polícia Académica, assim abolida pelo Decreto de 23 de Outubro de 1910.
Do discurso fazia parte à menção de que o fim de tais prerrogativas eram sinal d emodernidade, até porque, segundo os próprios "libertadores", em enhum país civilizado se concebia a existência, por exemplo, de uma cadeia académica (esquecendo-se que na Alemanha, por exemplo, elas existiam em grande número, e que só com a Grande Guerra este tipo de cárcere iniciará o seu declínio).









[1] CARVALHO, Joaquim - Instituições de Cultura (séculos XIV-XVI) Colóquio integrado no Projeto "Delfim Santos e a Filosofia da Ciência em Portugal", Centro de Filosofia das Ciências da Universidade de Lisboa ,  14 Set 2012.
[2] Provisão de 24 de Julho de 1721.

[3] BRAGA, Paulo Drumond - Aspectos do quotidiano Universitário no período Filipino - Estudos em Homenagem a Luís António de Oliveira Ramos. Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2004, p. 313-320.
[4] BASTOS, H. Teixeira - A vida do estudante de Coimbra : antiga e moderna : duas conferências na Associação Cristã de Estudantes, nos dias 29 e 30 de abril de 1920. Coimbra, Imprensa da Universidade, 1920.

[5] BRAGA, Paulo Drumond - Aspectos do quotidiano Universitário no período Filipino - Estudos em Homenagem a Luís António de Oliveira Ramos. Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2004, p. 313-320.
[6]
Por alvará de 26 de Agosto.
[7] Os “Estatutos Velhos” (de 1612), que vigoraram até Pombal, estabeleciam em casos de reincidência uma multa de 2.000 reis, isto além da pena de prisão por oito dias.
[8] RODRÍGUEZ Cruz, Águeda M. – Vida Estudiantil en la Hispanidad de Ayer, citado por “QVID TUNAE? A Tuna Estudantil em Portugal”. Euedito, Porto 2012, p.48
[9] Op.Cit.
[10] D. João V viu-se obrigado a publicar a carta régia de 7 de Janeiro de 1727, mandando riscar (expulsar) dos seus cursos o estudante que por palavras ou obras ofender outro, com o pretexto de novato (caloiro), ainda que seja levemente (ou seja ainda que seja uma ofensa leve), tal era a violência verbal e física entre estudantes, nomeadamente entre veteranos e novatos.
[11] O Conimbricense, 1878, nº 3:199
[12] O Conimbricense, 1877, nº 3:161


Ver também


CORREIA, António – “Caloiros-Novatos”, Rua Larga, de 15 de Abril a 25 de Novembro de 1958.
CRUZEIRO, Maria Eduarda – “Costumes estudantis de Coimbra no século XIX: tradição e conservação institucional”, Análise Social, Volume XV (60), 1979.
FRIAS, Aníbal - Praxe académica e culturas universitárias em Coimbra. Lógicas das tradições e dinâmicas identitárias in Revista Crítica de Ciências Sociais, 66, Outubro 2003: 81-116
NUNES, M. António - As Praxes Académicas de Coimbra. Uma interpelação histórico-antropológica, in Cadernos do Noroeste, Série Sociologia, Volume 22 (1-2), 2004.
MOTA, R. C. Margarida - Subsídios para o estudo da delinquência estudantil em Coimbra, 1871-1886, Universidade(s), História, Memória,Perspectivas, vols. III, Congresso História da Universidade, 7º Centenário, Coimbra, 1991 pp.321-330.
RODRIGUES, A. Manuel - Notas sobre a Universidade de Coimbra desde as origens (1290) até à fixação definitiva em Coimbra (1537). Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra.

VASCONCELOS, António de - Origem e evolução do fôro académico privativo da antiga Universidade portuguesa : breves apontamentos históricos. Coimbra, Imprensa da Universidade, 1917.


Artigo actualizado em Junho de 2013 com base em NUNES, António - Identidade(s) e moda, Percursos contemporâneos da capa e batina e da sinsígnias dos conimbricenses. Bubok, 2013, p.134







Notas à Raposa de Coimbra

Não se trata de uma qualquer classificação de uma nova espécie pertencente à família Canidae, mas da famosa "raposa", que prefigura o chumbo,  de que tantos já terão ouvido falar na famosa canção "O Afonso", de António Vicente,  cantada pela Estudantina Universitária de Coimbra (contante no disco "Estudantina Passa", de 1985) :

"Andava tão comprimido
Mal podia respirar
O ano estava perdido
E a raposa a espreitar (...)"


Qualquer estudante de Coimbra que se preza ouviu falar desta "raposa", figura matreira e esperta que simboliza o insucesso escolar, naquele argumento falacioso, e raramente justo,  de algo que não se esperava ou da sorte que nos foi avessa, como que "de propósito", ou do lente que tem numerus clausus para dar positivas, daquele que atira os pontos ao ar e classifica conforme a geografia onde cairam, ou simplesmente que "nos quis lixar a vida" porque nos apanhou "de ponta".
O Afonso, esse, percebeu que só estudando a sério, conforme reza a música, teriqa sucesso (que logrou alcançar, por fim, para orgulho do pai que já tinah um filho doutor).


Foto de Zé Veloso
A Raposa significa o temível chumbo. Certo. Mas por que razão, quando até é uma criatura que nem inspira o medo que outras mas "cotadas" costumam desempenhar (só mesmo os lavradores que viam na raposa um sorvedouro de galinhas e outros animais domésticos)?

A resposta é simples:


Quando se vai da Via Latina para os Gerais, existia, e ainda existe, um espaço onde antigamente os estudantes aguardavam para serem chamados a realizar os exames orais.
Tal espaço possui um painel de azulejos pintados com motivos bucólicos (flores, coelhos, uma construção que se assemelha a um moinho ea  raposa).
Precisamente junto à porta pela qual se acedia para a sala dos exames, um dos azulejos representa uma raposa.
Como sucede em qualquer sítio, qualquer parede era bom encosto para (des)esperar, enquanto aguardavam a vez para prestarem provas.
Claro está que todos os que chumbavam atribuíam tal à "má sorte" de se terem encostado à "raposa" ou estado perto dela, numa superstição que ganhou raízes e que será, porventura, das poucas, senão única, superstições que ganhou contornos de tradição e ícone na Praxe e memória colectiva dos estudantes de Coimbra.
Foto de Jotta Leitão


Já a moda de pontapear o azulejo com o bicho parece ser relativamente recente. Testemunhos reportam que a figura era inicialmente afagada, na intenção mística de obter as suas boas graças - isto nos anos 1940-50. Mais tarde, já provavelmente da década de 60 em diante, alguns começaram a mimar o canídeo com  1 a 3 pontapés (pondo em causa a própria integridade do azulejo), embora não estejamos em crer que seja propriamente uma praxis generalizada (que Lamy nem sequer refere) - e ainda bem. Tal prática pretenderia, afastar o malfazejo chumbo  e afastar a raposa numa espécie de "Vade Retro". Outros relatos, também recentes, refere que alguns estudantes, à socapa, costumavam cuspir para cima dela - mas numa prática que seria pontual e já como represália pelo chumbo obtido (e não como medida preventiva).
Superstições à parte, creio ser importante preservar o icónico azulejo que não tem culpa de coisa nenhuma.

Deixo aqui um pequno artigo que fala de um grupo de alunos que fez greve às aulas (parece ter a ver com algum tipo de braço de ferro com os professores), com os lentes acusados de se vingarem de tal afronta, chumbando os alunos que tinham aderido.
No artigo, já bem antigo (1886), é usado o termo "rapozas", como sinónimo, claro está, de chumbos, negativas ("negas"), reprovações.....

 Jornal A Liberdade (Viseu), de 02 Julho de 1886, 16º Anno, Nº 813




Nota: artigo actualizado com foto recente de Jotta Leitão, em 2015.

Notas aos Quintanistas de Coimbra

Como demos conta no artigo anterior, os quintanistas de Coimbra tinha profusa actividade cultural e artística.
Mas não apenas em bem preparadas récitas, que se tornaram famosas pela sua qualidade, mas também noutras iniciativas.
Chegar a quintanista era chegar au auge da carreira estudantil e, para gaúdio das populações, poder gozar de algumas liberdades que o estatuto de "estudante mais velho" possibilitava, já que era um ano onde era praticamente adquirido o facto de receberem o grau (como dizem alguns estudiosos, o último ano era já um "passeio"), pelo que com mais tempo, e menos pressão nos estudos, para poderem preparar diversas manifestações artísticas e culturais.

Aqui fica uma iniciativa ocorrida em 1888.




 Jornal O Commercio de Vizeu, de 03 Junho de 1888, III Anno, Nº 198

sábado, agosto 18, 2012

Notas às Récitas dos Quintanistas de Coimbra

Um costume muito difundido no final do séc. XIX prendia-se com a realização de récitas por parte dos estudante finalistas da Universidade de Coimbra, as quais saíam fora de portas e se realizavam em inúmeras vilas e cidades "limítrofes".

O facto de alguns destes grupos serem muita vezes denominados por "troupes académicas" (nome que também podia ser usado para significar Tunas), levou, em alguns casos, a alguns pequenos equívocos. Nada a ver, contudo, com a noção "praxística" de "Trupe".

Estas "troupes" (nome que vem do francês e significa grupo, sendo muito comum o seu uso para designar grupos ou companhias de teatro ou de artes circenses) eram grandes comitivas que se dedicavam essencialmente a representações cénicas (grupos dramáticos), embora também se fizessem acompanhar por músicos, nomeadamente para entoarem uns quantos fados.

Os estudantes eram recebidos como se de embaixadas oficiais se tratasse, como pompa e circunstância, váriso anúncios prévios nos jornais a anunciar a sua vindae programa, com as autoridades presentes, muitos discursos, oferendas.......

Estas récitas permitiam aos estudantes amealharem mais uns tostões para suas despesas, embora existam muitos relatos a darem conta de saraus, matinées e récitas com fins puramente caritativos, como sucedia na maioria dos espectáculos em que participavam estudantes.

Encontrei dezenas de referências a estas récitas que os estudantes, nomeadamente os de Direito, vinham fazer a Viseu (eram também muitos os viseenses a cursar Coimbra e, entre eles, o maior de todos, Augusto Hilário), mas também a saraus de caridade ou representações em altura de carnaval ou de férias escolares.
Mas não apenas Viseu, pois também outras vilas do distrito recebiam a visita destes estudantes que, nessa altura, faziam autênticas tournées pelas localidades mais próximas de Coimbra (como é o caso da Figueira), chegadno mesmo algumas a serem apresentadas, por exemplo, no Coliseu de Lisboa.

De referir, igualmente, como aliás um dos excertos comprova, que os próprios estudantes d eliceu promoviam récitas, igualmente aplaudidas e reconhecidas como tradição estudantil transversal.

Aqui ficam alguns artigos a darem conta dessas récitas e no que consistiam:


 Jornal O Commercio de Vizeu, de 10 Maio de 1888, III Anno, Nº 191



Jornal O Commercio de Vizeu, de17 Maio de 1888, III Anno, Nº 193



 Jornal O comércio de Viseu, 01 de Junho de 1893, VII Anno, Nº 718



 Jornal O comércio de Viseu, 25de  Janeiro de 1894, VIII Anno, Nº 786



 Ilustração Portugueza, 1ª Ano, Nº 23, de 11 de Abril de 1904, p. 359 (Hemeroteca Municipal de Lisboa).







Illustração Portugueza, II Série, Nº 329, de 10 de Junho de 1912, pp. 745-748 (Hemeroteca Municipal de Lisboa).





Illustração Portugueza, II Série, Nº 330, de 17 de Junho de 1912, p.799 (Hemeroteca Municipal de Lisboa).




Notas a Baladas de Despedida Liceais


Esgravatar o passado é sempre uma caixinha de surpresas.
Desta feita, um artigo muito interessante que nos dá conta de mais uma prática copiada dos seus colegas universitários pelos estudantes de liceu, desta feita os finalistas do curso do 7º ano de liceu, em Viseu.
Também os alunos mais novos tinham, pois, suas récitas e festas de final de ano, como aliás já vimos em artigos anteriores, sendo que também compunham e entoavam Baladas de Despedida, ao jeito do que se fazia em Coimbra.
Pena não ter encontrado partitura alguma do tema ou pista sobre a mesma, caso tenha alguam vez existido.


quarta-feira, agosto 15, 2012

Notas (en)Latada(s)

Este artigo traz-nos uma novidade para a larga maioria dos leitores: que as latadas também ocorreriam também nos Liceus (nomeadamente os ditos "centrais").
O artigo que se segue fala-nos de uma latada que, contrariamente ao que hoje sucede, assinalava, precisamente, a alegria do final do ano lectivo no liceu local  (à semelhança do que se fazia na Universidade).
Sabemos que só a partir dos anos 40 em diante é que a "Latada" foi movida para o início do ano escolar, ligada à imposição de insígnias.
Sobre a história das Latadas, já AQUI reproduzimos o que tão bem se escreveu no blogue Penedo d@ Saudade.

Sabemos que não apenas a capa e batina, mas muitas outras tradições eram partilhadas entre liceus e Universidade, fosse na recepção aos novatos, fosse em algumas festividades ou mesmo na formação de grupos de cariz musical (em Coimbra, por exemplo, a TAUC admitiu liceais durante décadas). Não se estranha, por isso, esta latada, embora ao invés dos nossos dias, tivesse sido levada a cabo em regime nocturno.

O caso concreto, aqui, é singular pelo facto de estarmos perante uma adopção recente, uma estreia, numa pacata cidade de província e em plena noite, o que motiva a crítica do próprio jornalista.

Recordemos que Viseu (e outras vilas nos arredores, como Tondela, por exemplo) era visitada 2 a 3 vezes por ano pelos estudantes de Coimbra (que não apenas os naturais), em saraus caritativos e, tradicionalmente, nas famosas récitas de quintanistas (normalmente de Direito), daí que houvesse uma tão grande proximidade aos costumes estudantis e o fascínio dos alunos do Liceu local que, tal como sucedia noutros brugos, procuravam imitar esses modelos, fascinados que ficavam por aqueles doutores de capa e batina, os quais gozavam de enorme prestígio e simpatia junto das populações.

O facto é que a dita latada protagonizada pelos liceais, ainda para mais à noite,  deu mais dores de cabeça que outra coisa, numa cidade pouco habituada aos ruídos estudantis (e aqui vem à memória uma das razões pelas quais a Universidade, nos seus primeiros anos de fundação saiu de Lisboa para Coimbra: as queixas da população quanto ao barulho e desacatos dos estudantes).

Não se encontrou ainda registos adicionais de novas latadas, deixando a entender, porventura, que a coisa não pegou.

Jornal A Liberdade (Viseu), de 04 Junho de 1892, 22º Anno, nº 1122

terça-feira, agosto 14, 2012

Notas que dão socos

Poderia este artigo ser comentáriuo de uma qualquer notícia da nossa actualidade (infelizmente tem sido comum), mas o facto é que tem mais de 100 anos.
Afinal, até certo ponto, parece que estamos, volta e meia, a repetir certos "costumes", embora nem sempre o bons, que algures se parecem ter perdido.

Em 1892, um certo lente de Direito viu a vida a andar para trás, quando um jovem estudantes decidiu vingar-se de um chumbo recebido.
Era uma época conturbada e violenta, em plena efervescência entre os âmagos feridos do Ultimatum inglês e os fulgores republicanos que se exacerbavam cada vez mais,  num país que atravessava a bancarrota, numa sociedade de contrastes onde muitas soluções passavam por ajuste de contas corpo e corpo.

Note-se, contudo, que este tipo de incidente não era norma, tendo em conta que tal valia ao estudante não apenas a cadeia, mas também a expulsão da Universidade e, consequentemente, a possibilidade de um futuro que não passasse por "vergar a mola".
Bem diferente, portanto, daquilo que hoje sucede, onde o contexto é bem diferente (apesar da actual crise financeira) e as agressões a professores são resultantes da ausência de valores, de educação e de lei que puna duramente quem o faz.

 Jornal A Liberdade (Viseu), de 09 Julho de 1892, 22º Anno, nº 1127, p.2

Jornal O Comércio de Viseu,  de 20 de Agosto de 1893, VIII Anno, Nº 741.

Notas de Imprensa à Troça de 1890

Todos ouvimos já falar da "Troça" designando alguns ritos ou "brincadeiras" (verdadeiramente entre aspas) com que os veteranos brindavam os caloiros.
Por "troça" entenderíamos, hoje (com as devidas diferenças), "gozo ao caloiro".

Num recente artigo aqui publicado, tratando do Canelão e Troça em 1898 (de notar que o "canelão" seria um dos ritos integrantes da "troça"), ficou a dúvida se o rapanço seria uma prática mais ou menos comum e parte da "troça" ou se sempre figurara como punição, aplicado nomeadamente pelas trupes) em casos especiais de violação das regras vigentes na hierarquia estudantil.

Penso que o seguinte artigo, que é de 1890, será esclarecedor quanto a esta matéria, apontando o "rapanço" como uma prática usual (mas também não seria aplicado por "dar cá aquela palha") e parte dos "mimos" que os pobres caloiros recebiam dos mais velhos.
Neste caso, parece que a tentativa de rapanço serviria de "despedida" antes dos exames (e da Latada - que na altura se fazia no final do ano lectivo), após os quais o estudante deixava a condição de caloiro. Tudo assim o indica, se atentarmos que o artigo é precisamente de Maio.

Outro aspecto, prende-se com as "pauladas", reforçando o que já aqui se avançou sobre Insígnias de Praxe (moca, colher....) onde se questionou a "moca" como ícone praxístico, quando a arma mais utilizada pelos estudantes era, afinal, o varapau.

Jornal A Liberdade (Viseu), de 23 Maio de 1890, 20º Anno, nº 1016, p.2



sexta-feira, agosto 10, 2012

Notas aos Estudantes de Coimbra em manifestação de apoio à Monarquia, 1908

Em 1908, ainda no rescaldo do regicídio (assassinato do Rei D. Carlos e do príncipe D. Luís Filipe a 1 de Fevereiro),  chega a Lisboa, a 27 de Maio, uma delegação da Universidade de Coimbra, para saudar o novo rei, D, Manuel II, acompanhada pelo reitor, Alexandre Cabral, e pelo secretário da Universidade, Manuel da Silva Gaio. Integram a comitiva de estudantes, entre outros, Carneiro Pacheco, Fezas Vital, Pacheco de Amorim, Paulo Cancela de Abreu e Luís de Almeida Braga.

À noite, realiza-se uma sessão no Teatro D. Amélia. O Times de Londres observa, na altura,  que "numa cidade, em que os republicanos predominam, as manifestações monárquicas, públicas e agressivas, tendem a tornar-se provocadoras". Com efeito, vários estudantes republicanos lançam um manifesto denunciando o processo e entre os subscritores estão futuros monárquicos como António Sardinha, Amadeu de Vasconcelos, Henrique Trindade Coelho e Martinho Nobre de Melo.

Alguns clichés dos estudantes, onde, mais do que aqui dissecarmos as questões d enatureza política, podemos observar o traje académico, nomeadamente no facto de, contrariamente aos dias de hoje, o laço ser bastante mais comum do que hoje (quase só para ocasiões de gala).

Reportagem "A manifestação monárquica da Universidade de Coimbra". Jornal O Século, Joshua Benoliel.

 Os estudantes de Coimbra saindo da estação do Rossio.
Cota: PT-TT-EPJS-SF-008-08338


Cota: PT-TT-EPJS-SF-008-08221_m0001


 A caminho do Paço no jardim de Santos.
Cota: PT-TT-EPJS-SF-008-08335

Notas a uma Capa e batina(zinha)


Na esquina de uma estante de livros, entre os corredores silenciosos de uma pacata biblioteca de vila, podemos sempre esbarrar em algo fora de vulgar.
Desta feita o livro é insuspeito (e quantos documentos assim o são, contendo, afinal, verdadeiras preciosidades?). Um livro de fotos de época, que me merecem sempre curiosidade,  onde o cliché que se segue apresenta algo incomum: um jovem rapazito trajando, a rigor, capa e batina, e com a capa descaída pelos ombros (como manda a Praxe que se faça em momentos "solenes").
Note-se que não se trata de Carnaval ou de qualquer festa de máscaras. Não é nenhuma rábula ou teatro de qualquer espécie, mas uma cerimónia oficial onde as pessoas se apresentavam vestidas para a ocasião (com seus melhores fatos, fatos domingueiros, ou fardas - que será o caso daquele "miúdo").

Haveria, de alguma forma, o hábito de também a instrução primária adoptar pontualmente capa e batina?
Sabemos, como comprovámos no artigo referente aos alunos do Colégio Lafonense, que não apenas os liceais dos liceus de cidade usavam capa e batina, mas daí a termos rapazes tão novos a trajar......
É curioso, de facto.
Conhecemos diversos exemplos de jovens alunos a frequentarem os Seminários ditos "Menores" (para os mais novos) onde os pequenso seminaristas se fazem fotografar em grupo, todos de batina eclesiástica, mas o caos aqui é outro, até porqu eo contexto nem é escolar sequer.


Acompanham o cliché o seguinte título e legenda, respectivamente:
Em 1931 a estrada chega à Ribeira do [rio] Teixeira. in Boletim Paroquial de Cepelos - Ecos do Povo n.º 50 (Julho Agosto de 1996).
53. Foto da inauguração da abertura de mais um troço de estrada até ao Rio Teixeira.



Fonte: Vale de Cambra, meio século de imagens. Vol. III - Macieira de Cambra - Fotografias da Família Sousa. Edição Comemorativa do 75º Aniversário de Elevação de Vale de Cambra a Cidade e do Reconhecimento de Macieira de Cambra a Vila. 2000

quarta-feira, agosto 08, 2012

Notas livrescas à Greve Académica de 1907

Um breve apontamento fotográfico sobre a Greve Académica de 1907.




Fonte: Portugal Século XX - Crónica em Imagens 1900 a 1910 de Joaquim Vieira, Círculo de Leitores, pp. 178-179.
Fonte: MÓNICA, Maria Filomena - A Queda da Monarquia, Portugal na viragem do século. Publicações Dom Quixote, Lisboa 1987, p. 263 (Foto do jornal O Século)


Para saber mais, aconselho um clique nos seguintes links (2 deles com Pdf que poderão guardar):

http://hemerotecadigital.cm-lisboa.pt/EFEMERIDES/Greve1927/GreveAcad1907.pdf

http://dererummundi.blogspot.pt/2009/03/greve-academica-de-1907-em-coimbra.html

http://www.scielo.oces.mctes.pt/pdf/rle/n9/n9a05.pdf

http://lagosdarepublica.wikidot.com/l-a-greve-academica-de-1907

e um video:


terça-feira, agosto 07, 2012

Notas de Imprensa ao Canelão e à Troça de 1898

Um dos costumes estudantis mais conhecidos em Coimbra diz respeito aos ritos de recepção aos caloiros, e que deu grande parte da má fama à Praxe, é precisamente o "canelão" (literalmente ir às canelas, ou seja dar caneladas/pontapés aos novatos) e a "troça", conjunto de práticas (a "pastada" que consistia em dar na cabeça dos caloiros coma pasta cheia de livros ou o "rapanço, entre outros) que pretendiam gozar os "bichos" (numa época em que muito disso passava por práticas violentas e vexatórias).

Encontrámos 2 artigos sobre o assunto num periódico de Viseu, o qual faz eco do que se passou em Coimbra, em Outubro de 1898.
No primeiro, datado de 21 de Outubro, temos o relato da prática, com a reportagem a dizer que mesmo com a polícia por perto, nada poderia fazer, tendo em conta a desproporção de forças.

Ainda um pormaior: o texto fala ainda em "polícia académica", supostamente abolida em 1834, data a partir da qual alguns dizem que se formaram as trupes constituídas por alunos.
Ou, de facto, só mais tarde a polícia é efectivamente extinta (note-se que ainda temos os archeiros a mando do reitor em 1898) ou então a polícia não era académica, mas o repórter assim a apelidou por força da tradição.
Parece estranho, contudo, que em 1898, mais de 50 anos após a suposta extinção da polícia académica, um repórter a ela se refira como existente, Mais ainda se ainda em 1898 existiam os archeiros, que são o corpo policial próprio (polícia académica) da Universidade.

No outro artigo, já datado de 25 do mesmo mês, temos notícia de ter sido publicado um edital a proibir os abusos e a prometer sérias penalizações, dizendo-se que isso levou os estudantes a conterem-se (a que terá ajudado o facto do reitor ter mandado os archeiros disporem-se na Porta Férrea).

A Liberdade, 21 Outubro 1898, ANNO XXVIII, Nº 1769, p.2




A Liberdade, 25 Outubro 1898, ANNO XXVIII, Nº 1770

Só no virar do século o canelão desapareceu, quando as praxes foram proibidas, aquando da implantação da república, dando lugar, a partir de 1919 (quando foram novamente "permitidas"), a outros ritos mais "disfarçados (como o eram os "pontapés da praxe" e, ainda mais tarde, os "calduços" ou "chachaçadas"). Também a designação "troça" vai paulatinamente desaparecer (embora, por exemplo, o rapanço se tenha mantido), vindo a ser substituído po rnovo vocábulo, sinónimo, "gozo".






sábado, agosto 04, 2012

Notas aos Bandos Precatórios

Eram denominados de "Bando(s) Precatório(s)"  o(s) grupo(s) de pessoas que ia(m) pelas ruas implorando a caridade pública em benefício próprio ou alheio.
Já há tempos aqui se abordou esta questão, num artigo dedicado à acção das Tunas neste aspecto, que podem (re)ler AQUI.

Numa época de muita miséria (quem não ouviu já falar na famosa "Sopa do Sidónio"?), de muita fome, encontramos inúmeras manifestações com fins de beneficência.
Fosse para asilos (infãncia desvalida, crianças  pobres, etc.), caixa dos estudantes pobres, para socorrer vítimas das cheias ou  outras intempéries, para acudir a diversas necessidades de gentes em aflição, os "cortejos de oferendas", os peditórios, os leilões (que ainda hoje se fazem por iniciativa das comissões fabriqueiras, mordomos ou outros grupos paroquiais), as quermesses, saraus, missas e matinés, tinham quase sempre, entre finais do séc. XIX e início do XX um cariz solidário. Podemos dizer que até aos anos 40, essa é uma característica inata e presente ao meio cultural e artístico: a arte em favor dos que mais precisam.

Com o alvor do Estado Novo, e querendo esconder a miséria do povo (pois o Estado queria passar a ideia de governar bem), esse tipo de iniciativas  praticamente desapareceu, embora a fome não (nomeadamente nos anos 40-50, anos marcados pelo racionamento), daí que a continuasse a "sopa dos pobres" (que ficou sempr  com o nome de Sidónio Pais, que a instituíu) e que os nossos pais e avós recordam sem grande saudade.

Numa recente incurssão à Torre do Tombo, encontrei alguns clichés, datados de ca. 1909, sobre este tipo de desfile (a que os periódicos da época  davam grande destaque), no qual as pessoas estendiam os cestos ou sacos, para receberem donativos.
Esses grandes desfiles (que iam das poucas dezenas às centenas ou mesmo milhares) eram quase sempre acompanhados por bandas ou filarmónicas, ou pelas Tunas, bem como, no caso de iniciativas académicas, pelos estandartes e docentes das escolas envolvidas.
Nesse especto, muito há que salientar a acção meritória e altruista dos estudantes (que não apenas os das Tunas), que redobravam em esforços e iniciativas caritativas.

Eis alguns desses clichés, tirados às portas dos jardins da Escola Politécnica.


Às portas dos Jardins da Escola Politécnica, podemos ver o pormenor do traje estudantil, com as características fitas no ombro direito e, em primeiro plano, dois deles levando o cesto/balde para recolher as oferendas/dádivas. Vemos ainda os alunos da Escola do Exército (devidamente uniformizados), lembrando que a larga maioria dos cursos ministrados (salvo o 5º, que era geral e o 1º que também dava acesso a engenheiros civis) servia a formação militar (exército e marinha), só numa fase mais recente serão ministrados estudos preparatórios ou acessórios para engenheiros hidrógrafos, professores do ensino secundário, alunos de veterinária e alunos de medicina.
Cota: PT-TT-EPJS-SF-008-03034_m0001





Em destaque a banda que acompanhou o bando precatório, servindo de chamariz à população, como era costume, já desde o tempo das bigornias nos desfiles carnavalescos, mais tarde as comparsas e estudantinas (Vd. "QVID TUNAE? A Tuna Estudantil em Portugal".)
Cota: PT-TT-EPJS-SF-008-03035_m0001




Neste imagem vemso algo bastante comum nos desfiles onde se incorporavam estudantes trajados: as capas abertas (também se fazia com eleas enroladas, como cordas), que os estudantes seguravam pelas extremidades.
Cota: PT-TT-EPJS-SF-008-01370



Foto do actual portão de onde, em 1909, saiu o bando precatório acima descrito.

Notas de Capa e Batina Lafonense




Dois clichés que provam que mesmo no interior do país, em pequenos núcleos escolares, o uso da capa e batina era generalizado e simbolizava, inequivocamente, o estudante (fosse liceal ou universitário), independentemente de ser de Braga ou Faro, Coimbra, Porto ou Lisboa.
Neste caso, estas fotos dizem respeito aos primeiros alunos do antigo Colégio Lafonenses (Oliveira de Frades - Viseu), diririgido pelo Dr. Mário Oliveira e Silva, antigo docente dos liceus de Aveiro e Bragança, que trajam capa e batina (a menina que se vê na segunda foto, ao centro, apenas tem capa pelos ombros, pois não teria traje), apesar de estar tão distante da sede de distrito ou dos grandes meios urbanos.
Estávamos em 1935-36.
Pormenor interessante, é ver que na primeira foto temos, à porta, um estudante trajado com laço, como também era usual.

Fonte:
GOUVEIA, Luis Alberto C. Fernandes e GOUVEIA, António Castanheira F. - 75º Aniversário dos Bombeiros Voluntários de Oliveira de Frades - Pontos nos is, 2004, pp.97,99.