sábado, dezembro 21, 2013

Notas à Praxe nos Liceus

A propósito dos debates que tiveram lugar no grupo Tradições Académicas&Praxe, aqui trazemos um excerto de uma intervenção que, estamos em crer, será suficientemente esclarecedora e que poderá desfazer quisquer equívocos sobre a Praxe e Tradição Académicas nos liceus.
 
Liceu Nacional Bragança, no 1º Dezembro 1967, por Henrique Martins,
 in blogue, 5l-henrique.blogspot.pt


"Em termos de legitimidade e historicidade, os liceus partilham da mesmíssima tradição da Universidade.
Claro está que havia diferenças, que a própria idade e liberdade de movimentos de um universitário tinha e os mais novos não. Estar na Universidade também conferia outro estatuto, era (e é) um outro mundo, um outro patamar.
Seja como for, isso não significa que a Tradição Académica tenha regime de exclusividade na Universidade (vejam bem que até o traje feminino foi primeiro instituído nos liceus e não na Universidade, pasme-se!). Muitos usos e costumes, muito da praxis eram comuns, independentemente de, em grande parte dos casos, os liceus copiarem e mimetizarem essas práticas.
 
a) Capa e Batina e pasta no Liceu? SIM, com a mesma legitimidade da universidade. Perderam entretanto o seu uso, salvo na Tuna do Liceu de Évora e Liceu de Guimarães: http://notasemelodias.blogspot.pt/.../notas-ao-fim-da...
 
b) Tunas no Liceu? SIM, e serão até mais antigas (cá em Portugal) que na Universidade: http://notasemelodias.blogspot.pt/.../melodias-aos-100...
 
c) Latadas no Liceu? SIM, desde o séc. XIX, e marcavam igualmente o fim das aulas (muitas delas feitas à noite): http://notasemelodias.blogspot.pt/.../notas-enlatadas.html

d) Serenatas e Baladas de Despedida no Liceu? SIM, num costume que é até anterior à inclusão de Baladas e fados na Queima de Coimbra (em 1949): http://notasemelodias.blogspot.pt/.../notas-baladas-de...
 
e) Récitas no Liceu? SIM, desde o séc. XIX: http://notasemelodias.blogspot.pt/.../notas-as-recitas...
 
f) Baile de Finalistas/Chá Dançante no Liceu? SIM, como ainda hoje muitos estudantes dos anos 40, 50 e 60 se lembram: http://4.bp.blogspot.com/.../Baile+Finalista...
 
h) Orfeons académicos no liceu? SIM, temo-los em quase todos os liceus nacionais (um exemplo apenas: https://www.facebook.com/notasemelodias.wb?ref=tn_tnmn...)
 
g) Luto Académico nos liceus? SIM, como tantos exemplos nos são trazidos pela imprensa (aqui só um exemplo:
https://www.facebook.com/notasemelodias.wb?ref=tn_tnmn... )
 
i) Dux no liceu? SIM, em muitos liceus existia uma estrutura praxística (tenho testemunhos directos da sua existência no liceu da Guarda, ainda nos anos 60, por exemplo).
 
j) Praxe no liceu? SIM, desde que usa capa e batina, pois o uso do traje é uma primeira forma de etiqueta e protocolo que implica ritualização. Depois todos os demais exemplos já referidos, anteriormente demonstram existirem usos e costumes também nos liceus (e escolas superiores que não eram universidades), naquilo que era, indubitavelmente uma TRADIÇÃO ACADÉMICA, UMA PRAXE NACIONAL, para além de algumas singularidades como a celebração do 1º de Dezembro, a data festiva nacional por excelência nos Liceus portugueses (um mero exemplo, de centenas existentes: https://www.facebook.com/notasemelodias.wb?ref=tn_tnmn...)
 
k) As praxes no liceu? SIM, naturalmente, como não podia deixar de ser, dada a proximidade e ligação à Universidade (recordemos que o liceu de Coimbra esteve anos largos sob “tutela” da Universidade, por exemplo).

Eram comuns, como refere Eduardo Coelho, a "cachaçada aos "caloiros" à entrada, nos primeiros dias de aulas, "levar à pia" - basicamente, molhar o cabelo à força - e "Viva a República", que consistia em mandar ao ar os cadernos e livros, ficando tudo espalhado pelo recreio,; às vezes, a pasta/mochila ficava no telhado e era uma chatice recuperá-la, quando se conseguia".

Também existia a praxe de levar o cabaço (varão/macho apenas) ao poste (pegar no tipo, dois pelas pernas abrindo-as e amassar-lhe os ditos contra um poste - quase sempre o que colidia era o rabiosque porque o visado esquivava-se com movimento de anca adequado).
Como acima mencionado, uma variante do canelão universitário era o corredor dos cachaços (o puto passava entre 2 filas de alunos a levar cachaçadas no lombo), que ainda vemos, pro exemplo, em uso no contexto desportivo. Muitas destas práticas ainda estavam bem vivas nos anos 80 do séc. XX.
 
Antigo Liceu Diogo Cão, Angola - Visita do Governador Geral, Rebocho Vaz, 1969
 
Alunos do Colégio Lafonense, Oliveira de Frades (Viseu), 1935-36
GOUVEIA, Luis Alberto C. Fernandes e GOUVEIA, António Castanheira F. - 75º Aniversário dos Bombeiros Voluntários de Oliveira de Frades - Pontos nos is, 2004, pp.97,99
 
 
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A enorme diferença é que, desde os anos 70, que os liceus abandonaram a capa e batina (sobre isso leia o nosso respectivo artigo, clicando AQUI), com pontuais excepções ainda em Évora e Guimarães e algumas reabilitações como o caso do Colégio de Lamego, e desapareceram quaisquer práticas, usos e costumes, salvo o baile de finalistas (que, de há uns 20/30 anos a esta parte, já nem sequer é baile, de facto, com as pessoas vestidas de gala, dançando valsas, tangos, etc. ao som de grupos de baile ou pequenas orquestras).
Assim, as actuais gerações estranham ouvir falar em Praxe, traje e praxes no liceu.
Pena que muitos achem que o traje é uniforme exclusivo de universitários, quando historicamente isso é falácia:
http://portoacademico.blogspot.pt/2010/03/o-decreto-10290-de-12111924-sobre-capa.html
 
 
(...)

Notem, meus caros, que o próprio termo “caloiro” e “bicho” são oriundos dos liceus e não da Universidade (onde se usava o termo “novato”). Bicho era o aluno do liceu que não tinha nenhum exame feito de preparatórios. Mais tarde será a designação para qualquer aluno de liceu. Caloiro era o aluno de liceu já com exame de preparatórios.
Mais tarde, os liceus adoptarão a designação “Cabaço” para designar os alunos que ingressavam pela primeira vez no liceu. Como é fácil perceber, a hierarquia praxística também existia e não era apenas algo intrínseco ao ensino superior."



 
Comemorações do 1 de Dezembro em 1947, In Liceu Velho, Liceu Novo, Cadernos do Museu do Som e da Imagem, nº 12. Vila Real 2012
 
Estudantes Liceu da Guarda, ca. 1960, Acervo de Tiago Almeida
 
 
Comissão das Festas Nicolinas (Guimarães) em 1992. Acervo de Paulo Saraiva Gonçalves
 

Alunas do antigo Liceu Latino Coelho
(actualmente Escola Secundária Latino Coelho) de Lamego.
 
 

 
É pois legítimo que os liceus reivindiquem e reabilitem a Tradição Académica (que também lhes pertence ), tal como o fizeram os universitários há 30 anos atrás.

São estes os factos.
Só fica na ignorância o burro, que é aquele que não quer saber ou teima na sua ignorância, depois de provado o seu equívoco.

2 comentários:

Eduardo disse...

Excelente!

Quod erat demonstrandum...

Mais uma vez, parabéns!

VCP disse...

:-)